domingo, 27 de março de 2022

Hiato

Algo no que diz parece

despedida. Essa é você fugindo?

Ou é mais um entretempo silencioso?

Algo no que espero é a silhueta

de um encontro. É minha dúvida gritando

ou sua incerteza murmurando?

É só mais um tempo? Um daqueles em que fingimos

que o cotidiano ocupa os segundos de algumas palavras?

É o conforto de não precisarmos lidar com as pairantes perguntas?

O silêncio grita. E o peito grita com o silêncio.

A reticência brada. Brada, clama e protesta em mim!

Demanda uma palavra a mais

que a torne diminuta.

Não sei se detesto pensar em versos

ou se aprecio versar a mente. 

Pois, é no vão do dessaber que mora

uma incerteza gelada e

uma esperança fervente. Ebulindo o desejo de um sussurro.

De um gemido.

E ainda que a calada não represente uma resposta

para as dores,

muitas delas falam baixinho na ausência da resposta. A calada

é uma resposta em si.

E por vezes ainda questiono se terei o benefício

da dúvida. Ainda que só me restem

dúvidas.

Dívidas alinhadas e divididas

para além das palavras.

Estímulos versados que querem ser 

abraço, calor, mordida e suspiro.

Ato. Anti-hiato.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Mortuary

Put some blood on it

and smear it all around.

Break some of your bones.

Bend over backwards! Perhaps you're not really trying?

Every last drop of you must be on it.

Takes some effort to disguise obsession

as true commitment. And it will hurt you deeply too!

All this red and white is your flesh laying there...

how about shaping it like a gentle breeze?

quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

Thin line

This isn't a romance.

It is a stare down

at a single glance.

A battle of one that took a chance

and put heaven on a countdown.

sábado, 25 de dezembro de 2021

Gravitacional

Estou tentando

superar

sua força gravitacional.

Apenas por instantes

escapar

do seu campo de influência.

Das suas curvas

no espaço-tempo

que causam essa efêmera órbita

demasiadamente lunar.

Como numa admiração venusiana

desigual

entre celestes.

Ah! quem me dera viajar numa galáxia de afetos

síncronos! Assim como os olhares que,

cintilantes feito as estrelas,

acompanham um ao outro num balé sideral.

Sei que o êxtase desse poço vasto, escuro e retorcido

causa certo fascínio

— como um presente do universo

que se desembrulhou em grande densidade.

Mas durmo cansado.

Cansado durmo e sonho.

Durmo, sonho e deleito-me

num atraente sistema estelar binário.

 A perene reciprocidade no infinito universo é tão bela!

segunda-feira, 6 de setembro de 2021

Taciturnidade

Qual argila é primordial

pra remendar um vaso partido?

Quantas cerâmicas são necessárias rachar numa existência?

Se grande dedicação é precisa

pra aplacar uma mágoa sentida?

Tua mágoa carrega culpa mas,

é revestida por dor ou rancor?

Quantas cumplicidades

pra fazer um novo amigo?

Como cativar com o silêncio? Sedutor?

Queres amar e conviver

sem entrega? Sob uma couraça que blinda-te e, sempre,

cala.

Quanto ressentimento

carrega teu perdão?

Nesse silêncio carrega

teus afetos.

Como o chiar radiofônico de uma transmissão

pela metade.

Como o ritmo distante dos trens que partiram da estação.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

Quebrado - André Benatte

Sinto por ser tão prolixo.
Maldito jeito afetado de expressar o necessário 
desnecessariamente. 

É mal do crucifixo 
carregado pelas dores em um pulsar solitário
diuturnamente.

Nunca foi uma cruzada por piedade.
"Fiz com eles o que fizeram comigo"
Dando em retorno apenas o que possuía,
Como Sansão revidando o castigo
Foi uma jornada por verdade.

segunda-feira, 23 de março de 2020

Latrocínio - André Benatte

Afogado e esquecido,
sentia dor.
Lá estava, mãos ao alto!
Sob a arma do bandido
Puxava o cão
— mais uma súplica —
Cléc, Cléc, Cléc...
BUM!
Assassinou o próprio amor
sob o pretexto de assalto.